A destruição ambiental no Norte e Noroeste Fluminense, visível a olho nu e acelerada ao longo dos últimos anos, é ponto de discussão em “Terra Vermelha”, a partir do dia 3 de agosto de 2024, no Paço Imperial. A mostra exibe os trabalhos do artista Raul Leal, que ao longo dos últimos anos documentou e atuou na região propondo uma prática artística que une sustentabilidade e artes visuais. Por meio de suas obras, “Terra Vermelha” aborda questões ecológicas do interior fluminense e utiliza a arte para provocar reflexões sobre as agressões ao ecossistema como um todo.
A vista natural e o bioma regional, que ao longo dos séculos inspiraram inúmeros artistas viajantes, agora sofre a ação extrativista humana. A erosão acelerada, as secas prolongadas, a má qualidade do solo e as mudanças no bioma regional são evidências de um problema ecológico que altera a paisagem. Buscando trazer esse cenário à tona, Raul Leal, natural da região noroeste fluminense, reflete sobre a ameaça ao bioma da mata atlântica evidenciando a alteração no território.
“Há um histórico de ocupação onde podemos observar processos de degradação do meio ambiente que hoje resultam em sérios problemas. Em meu trabalho, busco recuperar uma imagem que vem se apagando com o desaparecimento da natureza no interior do Brasil, resultante das práticas predatórias adotadas a serviço do lucro”, conta Raul Leal.
Em trabalhos que abordam a crise ambiental atual, a exposição Terra Vermelha apresenta diversas séries que variam entre a fotografia, desenho e gravura, no ímpeto de expor a devastação. Os trabalhos inéditos, realizados sumariamente em madeira, criam um inventário visual onde se apresenta diferentes espécies botânicas do bioma natural fluminense, fotografadas antes de uma ação de plantio, guiada por semanas a fio pelo artista em parceria com proprietários rurais e ongs voltadas ao reflorestamento. As fotografias são transferidas para placas de madeira criando uma catalogação afetiva desse processo. Em outras séries realizadas em madeiras naturais e queimadas Raul documenta animais que resistem nas áreas agredidas através de desenhos com pirógrafo e monotipias com pigmento de carvão.
“O artista enquadra cenas onde a vida natural ainda persiste, lutando pela sobrevivência,” afirma o curador da exposição, Lucas Albuquerque. “Estas imagens são sobrepostas a talhos de madeira, criando uma conexão direta com a tradição das paisagens na arte brasileira dos séculos XVII e XIX. Diferente dessas representações históricas, as imagens de Raul evidenciam o risco iminente da devastação.”
A exposição “Terra Vermelha” é o desdobramento de um projeto realizado no SESC-Campos em agosto de 2022. Apresentando trabalhos resultantes da ação direta do artista na região, a exposição incluiu o plantio de mudas de árvores com o apoio do SESC. Tais árvores foram documentadas e posteriormente transformadas em objetos de arte, exibidos na mostra, configurando um ateliê coletivo onde o público foi convidado a participar do desenvolvimento das obras ao longo dos meses.
Como maneira de articular formas de combater as práticas predatórias adotadas na região, diversas atividades complementaram a exposição no SESC-Campos, como a doação de mudas de árvores nativas, além de visitas guiadas e conversas que contaram com convidados como o professor e ecólogo Inácio Pestana, da Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF) e a ong Campos mais verde.
O desenvolvimento dos processos na exposição “Terra Vermelha” mantém o compromisso de promover a consciência ambiental através da arte, continuando a inspirar reflexões e ações concretas para a preservação dos ecossistemas brasileiros.
Lucas Albuquerque, 2024
SOBRE RAUL LEAL
Raul Leal é artista visual formado pela Escola de Artes Visuais do Parque Lage RJ. É especialista em gestão cultural pela Fundação Cecierj RJ. Residências no Parque Nacional de Itatiaia, na Universidade Federal do Espírito Santo e no Parque Nacional do Caparaó. Realizou diversas exposições individuais como “Serrapilheira” na Casa Fiat de Cultura em Belo Horizonte (2022) e “Terra Vermelha” no SESC Campos (2022) e coletivas em galerias e espaços institucionais como Caixa Cultural RJ, Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro RJ, Museu da República RJ, Museu de Arte de Blumenau SC, Oficina Cultural Oswald de Andrade SP, Museu de Arte Contemporânea de Ribeirão Preto SP, Sesi SP e Universidade Estadual de Londrina PR. Possui trabalhos em instituições como Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, Museu de Arte de Blumenau, Biblioteca Nacional, Universidade Federal do Espírito Santo, entre outras. Utiliza em sua produção artística os meios da pintura, desenho, fotografia, instalação e vídeo.
SOBRE LUCAS ALBUQUERQUE
Lucas Albuquerque é bacharel em História da Arte e mestre em Processos Artísticos pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Foi coordenador curatorial da Casa Museu Eva Klabin (Rio de Janeiro), produzindo diálogos entre seu acervo e arte contemporânea. Foi curador-organizador da Galeria Aymoré (Rio de Janeiro). Como curador do programa de residências artísticas do Instituto Inclusartiz (Rio de Janeiro), trabalhou estabelecendo conexões com artistas, curadores e pesquisadores entre Brasil e Reino Unido (Delfina Foundation), França (Frac Bretagne), Espanha (Homessessions) e Holanda (Rijksakademie). Realizou a curadoria das exposições “Muamba: brazilian traces of movement” (2023), na Ruby Cruel (Londres, U.K.); “Whispers from the South” (2023), na Lamb Gallery (Londres); “Ustão” (2023) e “Ultramar” (2023), na Casa Museu Eva Klabin (Rio de Janeiro); “O Sagrado na Amazônia” (2023), com Paulo Herkenhoff, e “Gamboa: nossos caminhos não se cruzaram por acaso” (2022), no Instituto Inclusartiz (Rio de Janeiro); “Futuração” (2021), na Galeria Aymoré (Rio de Janeiro); além de outras individuais e coletivas.